20 de maio de 2011

"PASSA, AVE, E ENSINA-ME A PASSAR" (Alberto Caeiro)



Vou à corte, que é como o Brasil trata Portugal até hoje, haja vista o ridículo tratado ortográfico implantado. Portugal não deu a mínima. O Brasil rasgou dinheiro.
Não encontrarei Pessoa ou Almada Negreiros no Martinho da Arcada, caminhando pelo Chiado, por Lisboa inteira, mas saberei que está ali, definitivamente ancorado.
Andarei pelo Bairro Alto, pleno de promessas, e ouvirei um sotaque de que nunca gostei muito. Lembra-me sempre um pouco o português de José Cardoso Pires, sempre a se queixar. Sério demais, rabugento quase sempre. A verdade é que em contraponto aos nossos ronaldinhos Portugal tem como ícones Camões, Fernando Pessoa e Saramago. É uma diferença. Talvez aquela que nos coloca sempre em terceiro mundo.

Parece que em Portugal não gostam muito de que Saramago tenha sido internacionalmente maior do que Cardoso Pires. Não sei, ouvi falar. Todas as generalizações são arriscadas. Gostaria de encontrar António de Almeida Santos, mas que sei eu? Sou o que posso, transeunte inútil de ti e de mim, transeunte de tudo, até da minha própria alma.

"Não sei ser triste a valer
Nem ser alegre deveras.
Acreditem: não sei ser."

Vou , pela noite adentro, e por meu pé entrarei.
Vou e volto. Espero voltar. Alegria enorme de voltar e encontrar, desde o alto, o Rio de Janeiro, meu primeiro amor, renovada alegria perseguida. Voltar e encontrar o que há de mais belo, grandioso e surpreendente e também terrível, feio e assustador. Ainda assim, cultuado - pobre grande amor!

"Assim, impossível, o nosso amor será eterno."

Pois vou, e espero que estejam todos aí, meus caros leitores amigos (e também os desafetos), firmes, lutando diariamente, escapando dos abismos, evitando as torrentes ou qualquer coisa que, de repente, sem aviso nenhum, mude o curso do rio que pensamos conhecer. Que tenham a revelação que esperam, e não recebam aviso nenhum do prazo que expira.
Vou (é quase certo) e volto (não sei ao certo), mas deixo-lhes o poema. Que mais posso deixar?


Humanu


há sempre aquele que em silêncio nos ausculta
sonda nossos gestos
avalia a profundidade dos líquidos
em que nos movemos

há sempre alguém que perscruta
e sem cautela
investiga (e condena)
a nossa alma despida

joga a rede de palavras e quer
por que?
nos apanhar

há sempre alguém que não contente
quer sentir também
a nossa sede

...

9 de maio de 2011

TU ÉS RESPONSÁVEL PELA CANNABIS QUE SATIVAS

















Com essa frase criativa, cujo autor não identifiquei, e em clima de muito humor, aconteceu no sábado, na praia de Ipanema, a edição 2011 da Marcha da Maconha, que resultou em um número substancialmente maior de pessoas do que nos outros anos. Falam em cinco mil. Pode ter sido mais, ou menos, mas era mesmo muita gente.
Isso se deve ao movimento organizado que trabalha durante todo o ano para que a Marcha aconteça, não só no Rio e em outras capitais, mas neste ano também em outras cidades como Niterói, Rio das Ostras, Jundiaí, Atibaia e Campinas. Também pelo reforço da banda Planta na Mente, que estreou no Carnaval e já vem fazendo história, com letras divertidas e grande animação.
Reforço político, só mesmo o de Carlos Minc, porque coragem, vocês sabem, é coisa escassa. Minc falou, falou muito bem, reportou-se à aprovação da lei pela união estável dos homossexuais e disse que que "É chegada a hora de haver este mesmo avanço em relação à legalização e descriminalização de todos os usuários. O usuário não é criminoso. As prisões do País estão cheias. Não temos que gastar mais dinheiro com prisões. Temos que gastar com escola, esporte, cultura e estágios, dando alternativas à juventude." O discurso completo está no Youtube, para quem quiser. Não só mandou bem, mas também participou da caminhada ao lado dos militantes, exibindo um bonito colete de cânhamo, naturalmente.

Maconha mesmo não tinha. Só a fumaça de um baseado gigante que os manifestantes levaram e também uma fantasia de baseado. Fora isso, bebês com seus pais alegrando a parada, cartazes reivindicatórios, música, felicidade mesmo de quem pode por um dia expressar-se livremente por força de um habeas corpus. Mas acender um ... isso não podia.

E agora me diga: como é que você pode organizar um movimento em favor de alguma coisa sem fazer apologia? Se você pensa que alguma coisa é boa e deve ser legalizada, como não falar bem dessa coisa?
E quanto à polícia? Bom, a polícia estava lá com muitos carros e aquelas caras feias que eles usam permanentemente. Se não estivesse, ninguém teria colado uma adesivo na moto de um deles - o que resultou no único incidente registrado. Coisa pouca. O bom, o bom mesmo seria é que os homossexuais, que já estavam tão alegres com a vitória legal, fossem levar solidariedade aos que ainda permanecem na marginalidade por força do preconceito.Mas não foram. Pelo menos, não foram todos os que fumam
Ainda não aprenderam que quem sofre UM preconceito deve lutar contra TODOS os preconceitos. ...















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5 de maio de 2011

"FAÇAM COMPLETO SILÊNCIO, GARANTO QUE UMA FLOR NASCEU." (CDA)

As drogas não estão proibidas por serem perigosas; são perigosas por serem proibidas

(George Apap)










O ano passou rápido. De novo está aí a Marcha da Maconha que se realizará no próximo dia 7 de maio, sábado, saindo do Jardim de Alah na direção do Arpoador.
Os jovens engajados acreditam que um dia a legalização se fará, assim como está perto de se tornar legal a união estável entre homossexuais, o direito ao aborto para as mulheres que não se consideram aptas a ter filhos, o direito à moradia e ao trabalho para todos. Utopias? Nem tanto.
Cresce o número de pessoas que consideram natural fumar maconha, que reconhecem suas propriedades terapêuticas, valor econômico, e necessária a legalização, tendo em vista a cadeia de corrupção e violência que a proibição acarreta. Mas os interessados na corrupção e na violência não querem ouvir porque ouvir (e respeitar) é o mesmo que diminuir os lucros.
A Justiça, infelizmente, é cega e retardada. Sempre vem atrás das necessidades da sociedade. Com a desculpa de que quer ouvir a todos, não satisfaz a ninguém.
No ano passado houve praticamente um levante em defesa da legalização, que se alastrou pelas capitais e chamou a atenção de todos pelo grande número de pessoas que se mobilizaram em defesa da causa. Normal. Quem pensa, lê, ouve os argumentos favoráveis, não pode deixar de pensar que é muita repressão para uma prática que nasceu justamente no momento em que se buscava a paz entre as pessoas. E talvez essa seja a característica mais marcante da maconha: o fato de que usada coletivamente, nunca induz à agressividade, mas à harmonia entre os adeptos, como um exercício de aceitação do outro.
Talvez seja justamente isso que uma sociedade violenta não quer. Os violentos querem plantar a violência, enquanto os maconheiros querem distância disso. Pregam a paz e praticam o amor. Pode parecer passadismo, não é. Paz e amor podem ter saído de moda, mas não desapareceram como desejo profundo da humanidade que ainda não adoeceu. Todo o mundo quer ser feliz. Só não sabe como. E o uso da maconha não é uma fuga, como muitos dizem, é um encontro. É o encontro com a sensibilidade aprisionada pela sociedade repressora, que quer controlar pensamentos e atitudes de todos para mais facilmente manipulá-los.
A luta contra o preconceito não tem fim. E quanto mais politicamente correta se torna a sociedade mais se acirram os ânimos contra as diferenças. É crime o racismo, a homofobia, a agressão às mulheres e às crianças ? Pois nunca houve tantos casos. É proibido beber e dirigir? Até as autoridades fazem isso. É proibido matar sem julgamento? Auto de resistência neles.

Não é a lei que planta a consciência. A lei só estabelece a obrigação.

Chega de hipocrisia. As idéias crescem, se fortalecem e criam asas. Impossível alcançá-las e dizimá-las, como se faz com as plantações. Uma idéia é livre e imprevisível. Ilude a polícia, rompe o asfalto. E um dia, como queria Drummond, se fará completo silêncio, os negócios serão paralisados, porque uma planta nascerá para ser livre como as outras.




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