21 de fevereiro de 2010

MULHERES

Querer-se livre é também querer livres os outros
(Simone de Beauvoir)


Escrevi uma crônica há algum tempo, sobre Mulheres & Maconha, a partir de uma observação levantada por uma pessoa presente ao evento organizado pelo jornal O Globo e que se realizou na Oi Futuro, no Flamengo, em maio.

Um homem registrou sua estranheza quanto à tímida participação das mulheres no movimento para legalização das drogas. A jovem jornalista designada pela editoria fez um trejeito como quem dissesse? E eu? Ela não sabia que se não fosse mais graciosa do que inteligente não estaria ali.
Fui a única mulher na platéia a falar. No entanto, havia mulheres na platéia.
Este assunto vem à tona para lembrar que Dilma candidata ainda representa muito pouco no avanço da igualdade para as mulheres brasileiras. Estamos mal. Os partidos políticos nem mesmo conseguem cumprir a obrigatoriedade de 30% de representação feminina. Depois de Woodstock parece que tudo parou. As mulheres deram um passo atrás e quiseram se tornar homens, umas pela forma, outras pelo comportamento. Deu merda. Começou outra guerra entre os sexos.
Não há igualdade entre sexos e é até um bom embate, mas é possível a igualdade de tratamento. Já avançamos muito, considerando o atraso que sempre nos separou dos mundos de conhecimento (não estou falando da elite, se me entendem). Uma epidemia que não tem combate, fora os computadores e o ar condicionado nas salas.

A palavra é educação, essa terrorista. A cantada soberania não se aplica ao princípio da coisa. Pairando sobre tudo, o medo. Então era uma educação para o medo? Quem sabe o que acontece na delegacia quando uma mulher vai se queixar da violência do homem, no caso, o seu homem? Quantas mulheres morreram mesmo depois de sucessivas denúncias na delegacia? Há o caso da mulher que foi cantada pelo policial que registrava a ocorrência.

O preconceito é a palavra do dia desde sempre. Ele vem do medo do outro. Não tem nada a ver com o outro, é só o próprio medo.
Quem viu Os direitos da igualdade, o filme sobre a vida de Harvey Milk, ativista gay norte-americano do final dos 60, sabe do que estou falando. Milk trouxe para o movimento também os velhos e os sem teto, porque sabia que eles também sofriam preconceitos de outros tipos.
Já lá se vão 50 anos. E a revolução feminina se resume em moças que repetem um refrão que é, conforme ouço do som que chega do baile funk,
Vá tomá
vá tomá
vá tomá
no cu.

Mulheres menstruadas. Mulheres no cio. Mulheres grávidas. Mulheres parto. Mulheres puerpério. Mulheres menopausa. Mulheres dependentes. Mulheres salários. Mulheres empregos. Mulheres cesta básica, Mulheres de aluguel, Mulheres à venda, Mulheres escravas, espancadas, estupradas, velhas, inválidas, catatônicas. Mulheres BBB.
Que posso dizer? Lutei (e ainda) o quanto pude sem matar ninguém.
Chego aos 63. Nunca pensei. Obrigada, Simone.
.
.
OBS: e a crônica? estava datada. já era. mas também lembrava Simone..
.
..

18 de fevereiro de 2010

VOLTA DO CARNAVAL


Se eu não morrer,
Muito prazer

Victor Colonna

Passou o Carnaval como passou há pouco o Natal. Sabemos que acontecerá, preparamo-nos ou não, ele chega de qualquer jeito. Há que adaptar-se. Depois as estatísticas, os arquivos de sempre: tantos mortos, tantos feridos. Lá se foram uns, por pouco não fomos nós. Quem sabe na próxima. É possível prever a morte súbita?
Às vezes não se morre, foi um acidente e sobrevivemos. Sobreviver é viver sobretudo? Mas as seqüelas, as adaptações. Não somos mais quem éramos. Somos outros. Outras vidas. Nunca mais a vida antiga, para sempre nunca mais.
E os sonhos, que nos avisam do inevitável? Prevenimo-nos sem sucesso. Ele nos alcançará na queda enquanto tomamos banho e a viagem será a mesma se voássemos pelo despenhadeiro. O vôo terreno para um mar de perguntas.
Por que eu? Por que agora? Não sei, não sabemos.

O que sei é que voltei inteira à minha casa, meu gato, a mim mesma, esta que penso ser. Alguém com meu nome.
Hoje morri, amanhã faço anos. Minha vida (chamo minha a vida de que não disponho) segue simplesmente.
Dizem que é bonito em outros mundos, mais bonito que o mais bonito que conhecemos. Não sei. Viver é assim mesmo, essa perplexidade a cada aurora. Mas segue para todas as espécies do planeta, em seus propósitos naturais.
Voltei, estou, ressurgi - não sei como dizer, mas estou contente. E de contente ofereço a vocês um milagre absurdamente comum; enorme, ainda que mínimo - promessa de pássaros.
E vamos vivendo fevereiro, que é o que temos.
.