20 de agosto de 2014

POESIA PERNAMBUCO



A vida é isso que já constatamos: um nascer e morrer sem fim. No intervalo, os membros da espécie encontram o quê fazer nesse caldeirão de pratos feitos que é o dia-a-dia. Desde que somos pequenos nos ensinam coisas: regras de convivência, o que pode e o que não pode, o que se deve e o que não se deve. O resto da vida levamos para saber o que realmente procede e nos mantém dentro dos limites e o que nos mentem para nos explorar. Levamos, portanto, uma vida para saber que a coisa não era bem assim, e quando sabemos, ela já vai acabando.

No meio da multidão da espécie nascem os poetas. Iluminados, enigmáticos, proféticos. Não é fácil sê-lo, e menos ainda nesses pobres tempos em que o deus mercado se apropria de tudo o que é original, e, quando não há, cria alguma coisa que pareça. Os poetas ficam à margem. Alguns, por geniais, se agigantam; outros se deixam cooptar por um sonho vencido e ainda outros sabem que sua voz não é ouvida mas não deixam de escrever porque essa é sua necessidade. 
O Brasil inteiro é berço de altíssimos poetas, mas talvez seja em Pernambuco onde eles mais proliferam, movimentam-se, encontram-se (porque são muitos) nas ruas e nos bares. E tem o cinema, a música, tudo é original em Pernambuco, em especial em Recife. A única coisa que não muda são as oligarquias e suas hordas.
Há pouco tinha morrido Eduardo Campos e recebo do meu querido amigo e poeta Joca de Oliveira uma cesta-poesia. (Que tal, Dilma?). Na cesta, os Quase Haicais II de Joca, a edição nº 13 do Balaio de Gato, obra do incansável Jorge Lopes, o livro de Manoel Cardoso Esmerilho-me na lâmina do dia, Do moço e do bêbado, de Erickson Luna e por fim o CD Digitais, onde estão 360 poemas de Malungo que, sempre ligado, encontra a poesia e traduz o sentimento das ruas que cruza, igualzinho ao que canta a Nação Zumbi: Quanto vale um Malungo/ Malungo vale uma vida/ um samba de muitas cores, passos, bits, vibrations, uma rajada de notas viradas, equilibradas, partidas.
E chega de papo e viva Jorge Lopes, Chico Espinhara, Tarcísio Pereira e a Letra 7 e todos os poetas que criam a cultura brasileira com alma pernambucana. Viva Joca e Wilson Vieira, Viva Jomard Muniz de Brito, que não pode ficar de fora de qualquer coisa. Muito menos de poesia. Muito menos de Recife.



Alguns poemas estão em






17 de agosto de 2014

AOS QUE SE VÃO


Ariano Suassuna não existe mais no mundo dos vivos. Há de criar outros mundos, onde estiver, ou outros movimentos, que sua vitalidade ainda era para muito. A sua morte, e as outras que vieram depois ainda tentam se encaixar na realidade quando Eduardo Campos explode no rol das improbabilidades, atropelando todas as outras que se ofereciam a ela: a dos agonizantes, dos suicidas, dos desnutridos. A morte, no entanto, não dá a mínima para probabilidades. Ao contrário, prefere surpreender. Dessa vez concretizou-se numa explosão que impactou o Brasil, trouxe a trágedia para a realidade da família de cada vítima e mexeu profundamente com o processo eleitoral. Não nos queixávamos da apatia? Pois aí está o fato que nos faz cair sentados, sem entender nada, ou pelo menos sem entender por muito tempo, até que chegam as notícias, os analistas, a nossa própria elaboração do que aconteceu. 
Nada muda. Nesse momento há novos filhos sem pai, conhecendo a morte irreparável,  trazendo-lhes uma sombra que pesa para quem tinha a certeza de um futuro promissor. Depois do enterro, a pergunta: e agora, o que vai ser de mim? O tempo, dirão uns, o tempo tudo aplaca. às vezes até cura. 
Passado isso, preparo-me para a morte de amanhã e me pergunto: o que ficou? O presidente do partido e Marina fizeram um pacto de não falar em sucessão antes do enterro, Entretanto anteontem mesmo os jornais já levantavam a possibilidade da viúva de Eduardo Campos ser vice de Marina. Ora, isso quer dizer que a viúva deve ter sido consultada e que portanto não houve pacto nenhum. O pacto era só para figuração, sentimentalismo. E com essa mentira iniciam uma campanha, uma nova campanha. 
Ah espécie humana, tão especial. Chora, ri, sofre e tortura.  Uns são políticos, outros são poetas. Uns riem sempre. Outros têm um cantar estranho.


LÁPIDE

Ariano Suassuna


Quando eu morrer, não soltem meu Cavalo
nas pedras do meu Pasto incendiado:
fustiguem-lhe seu Dorso alardeado,
com a Espora de ouro, até matá-lo.

Um dos meus filhos deve cavalgá-lo
numa Sela de couro esverdeado,
que arraste pelo Chão pedroso e pardo
chapas de Cobre, sinos e badalos.

Assim, com o Raio e o cobre percutido,
tropel de cascos, sangue do Castanho,
talvez se finja o som de Ouro fundido

que, em vão – Sangue insensato e vagabundo —
tentei forjar, no meu Cantar estranho,
à tez da minha Fera e ao Sol do Mundo!

...

10 de agosto de 2014

URUGUAY - A LIBERDADE É AZUL




Houve Copa? Já ninguém se lembra. 
Naquele tempo fui ao pampa, cujas fronteiras são linhas imaginárias, uma terra só, como no livro de Aldyr Schlee, uma terra a que pertencem todos os gaúchos, muito, muito antes das fronteiras e das cercas de arame farpado. A planície, o pôr-do-sol, o frio, o frio.
Mas quando se chega de viagem, tudo não é mais. Parece até um sonho o que foi vivido há tão pouco tempo, a realidade com a qual convivemos durante dias: ruas, clima, idioma, pessoas que se tornam conhecidas, que passam a nos cumprimentar. Tudo vai se diluindo na memória.
Mas tem uma lembrança que não quero deixar de registrar: estar cara a cara com a liberdade. 

Cheguei muito cedo a Montevideo. Fui de ônibus de São Paulo até lá. Não queria me aborrecer com revistas em aeroportos. Detesto ser revistada em aeroporto e muito por causa disso vou dispensando os aviões. Um frio de dois graus e o ônibus parado na alfândega, horas, nada acontecendo, só homens caminhando, no frio, todos com a cabeça enfiada no pescoço, como se adiantasse. E ainda mais quatro cachorros farejadores e feios, daqueles de corpo gordo e pernas curtas e finas. Que merda, pensei. Mas então o ônibus saiu, afinal.
Em Montevideo a entrada no hotel era só às 14h. Deixei mala, tomei café e saí pra 18 de julho rumo à feira da Tristan Narvajo. Longe, para quem está com frio. Mas era preciso, além de tudo, fazer hora. 
Domingo, o centro vazio. Caminhar, caminhar, o vento cortando pele e lábios, até chegar às mesmas bancas de sempre, nessa hora apenas poucas armadas. Fui até o fim, andei pra lá e pra cá à procura de uma nesga de sol que fosse, mas o sol não vencia o frio.
Na volta já havia bancas arrumadas e foi quando vi umas coisinhas com a folha da maconha: cinzeiros, cachimbos, maricas, quimeras. Finda a compra perguntei: e o produto? Quer também? perguntou o vendedor ao lado (que era artesão de Uberaba) Eu disse que sim e ele me mostrou, dentro de um pote de vidro, uns camarões que há tempos eu não via. Quer fumar? me perguntou o outro. Agora pode. Quer dizer, eu e o amigo aqui já fumamos há 40 anos, mas agora pode mais.
Ele fechou um baseado ali mesmo, fumamos, a maconha era boa, eu fiquei por ali, o povo chegando, o sol demorando, um frio de matar, una charla. Ele me disse que estava indo para Punta del Diablo, se eu queria ir... Eu? Presa às reservas e às datas? Me despedi e segui meu caminho. Que caminho? Sozinha em Montevideo, um frio de lascar, os uruguaios vendendo coisas inacreditáveis ou trocando entre si as coisas velhas que se acabam, mas continuam à venda.
Caminhei muito naquela manhã, agarrada às minhas valiosas compras, aproveitando efeitos que um café ou uma cachaça não me dariam. E nem poderiam. Estava tudo fechado.
Perto do meio-dia achei um restaurante. De cara tomei dois chocolates espessos. Depois vieram os chivitos. De postre: torta de maçã. Tudo junto para aliviar o frio, a fome e a sede.
Perdi a vez em Amsterdam, mas ao Uruguay eu fui. E depois: Parque Rodó, Rambla, Malvín, Pocitos, porto. Tudo livre, tudo limpo. 

Agora vejo Dilma de mãos dados com os evangélicos. Cabeça e pés voltados para o passado. A cabeça quente com a pressão dos votos. Onde está o ímpeto revolucionário? Só houve, desde aquele tempo, um ideal a alcançar? Como se o homem não fosse uma máquina de querer...?
Onde está a vontade de acabar com a guerra às drogas, (a que chamam a guerra aos pobres) a prisão arbitrária, o abuso de autoridade, a milícia, a tortura nas cadeias, a desumana superlotação? 
No Uruguay, que eu saiba.

Quem tem essa coragem?
Pepe Mujica, que eu saiba 


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7 de agosto de 2014

O CHEIRO DA MENTIRA

Vocês já repararam como o Aécio está parecido com o Toni Ramos? A nobreza rural e o Friboi andam de mãos (ou patas?) dadas. Há mais tempo, antes da Copa, o Aécio dizia na televisão que queria falar comigo. Fiquei apreensiva. Que coisa! O Aécio querendo falar comigo. Que teria ele para me dizer? Bom, por via das dúvidas desativei meu celular.

No governo FH, quando o Serjão morreu (alguém se lembra do Serjão?) e Arruda despontou como liderança eu vi de cara: um canalha. E não me decepcionou.


Também há alguns anos quando houve eleições e eu, motivada pela possibilidade de representar os interesses dos escritores, me candidatei pelo Partido Verde (sim, eu fiz isso), conheci na convenção do partido (mas não fui apresentada a), Rodrigo Bethlem, egresso do PFL, se não me engano, e senti logo o cheiro de corrupção. Pensam que não tem? Trabalho com eles há muitos anos. É possível sentir.


Pois bem, o que eu quero mesmo dizer é que as eleições estão aí,diferentemente da Copa, sem paixão alguma, sem sacrifício de ninguém, sem torcidas que não sejam pagas. Isso é democracia, dizem. É como ver um filme fraco com alguma complacência, ainda que nos doa a perda de tempo e, seriamente, a complacência.


Havia uma ditadura. Queríamos votar. Finalmente chegou o dia. Votamos. E votamos de novo. E os milicos foram se recolhendo aos quartéis.  E já eramos uma democracia outra vez. E agora? Ninguém nos entusiasma. Mas as eleições existem. Não era o que queríamos?



O chato ao se escrever sobre eleições é que as postagens vão sem fotos. Vocês hão de concordar que não dá pra poluir um espaço onde se quer verdade.


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