22 de maio de 2010

FORÇA BRUTA VERSUS FORTALEZA


"Volta a 68?"

"Acredito no debate baseado na Liberdade."










Primeiro amordaçados, depois mais fortes com a chegada de adeptos e simpatizantes, os manifestantes pró-legalização das drogas em Fortaleza não se deixaram vencer pela decisão arbitrária. Resistiram carregando cartazes e chamando a atenção para a causa na Av. Beira Mar, na tarde de domingo.
Um número surpreendente de viaturas de policiais federais se fez presente, e os policiais, de maneira bastante bruta, carregando armas pesadas, proibiram que os manifestantes pronunciassem as palavras "polícia" e "maconha".
A Marcha, disse o Comandante do 5º Batalhão, não houve. Mas mesmo não havendo mereceu no outro dia duas matérias nos jornais O Povo (Passeata pela liberação da maconha vira protesto pela liberdade) e Diário do Nordeste (Passeata pela liberação).
Na reportagem de Nicolau Araújo o jornal O Povo informa que durante quatro horas (foram mais) policiais e manifestantes travaram uma espécie de "guerra fria", depois que a Justiça proibiu o movimento em Fortaleza, durante o sistema de plantão.
Os manifestantes, no entanto, não ficaram frustrados. Ainda que sejam quase todos muito jovens, já aprenderam a lidar com a repressão e o arbítrio. E não são mais ingênuos. Aprendem as lições. Por isso o balanço foi positivo. A marcha sonhada não aconteceu, mas tanta ostentação da justiça e da polícia, seu braço armado, serviu para chamar a atenção da população e para ajudar a divulgar a nova data da Marcha - 1º de agosto. Esta é a data para a qual está chamando o organizador, José Pinheiro Junior, e a moçada toda do Ceará, Billy, Diego, Mário, Muy Loco, Drica, Mirela, Tiago, Sabine, Ítalo.
Se não for em agosto, será em setembro. Ou outubro, ou seja lá quando for, porque desistir ninguém vai.
E polícia é para quem precisa.
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Obs: aliás, parece que quem precisa de polícia é a polícia mesma, haja vista os recentes exemplos: policial mata homem que usava furadeira; policiais prendem outros policiais; policiais algemam pé de maconha; policiais deixam fugir o preso da viatura; policiais deixam morrer a vítima e ficam com os pertences; policiais matam motoqueiros .. e por aí vai.
E a Justiça, para quem é?


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14 de maio de 2010

PAI - 14 DE MAIO



Escrito assim, tão curtinho, parece pouco: pai.

Não tenho pai há muito mais tempo do que não tenho mãe. Foi quando saí de casa que passei a olhar minha mãe como mulher. Meu temperamento rebelde se insurgia contra a condição da mulher na sociedade em que eu vivia desde aquela época, e que na minha família era ainda mais rígida. Era uma aversão institntiva. Eu não sabia nada de lutas. A mãe era o escudeiro do pai, mas era quem mandava em nós.

Lembro que quando as moças começaram a usar calças compridas, que naquele tempo se chamavam slacks, eu tinha que sair com a calça na bolsa e trocar em outro lugar. Dava um trabalhão. Tudo porque o pai não deixava. Por que? Não ficava bem, e pronto. Mas a ordem não vinha dele, vinha dela. Tudo para poupá-lo.

E o cigarro? (e era o careta!) que mão-de obra. Fumar escondido, e depois ter que disfarçar o cheiro. Talco no banheiro, o vapor do banho de horas, onde guardar os cigarros? Ter ou não ter fósforos? As irmãs de olho. Viajar de trem e esperar a noite para fumar não um, mas vários cigarros e me sentir a Anouk Aimmé. Na estação me esperava Yves Montand. Fumaça nos outros? Nem se falava nisso. O importante era o glamour. E esconder a pílula? Ó Deus. O que era pior: o cigarro ou a pílula? Minha irmã dizia: Vais matar o pai. Matei-o de desgosto ou ele tinha outras tristezas que nunca soubemos? Haveria um prego na porta?

Meu pai tinha a palavra delicada e nobre. E duvido que algo lhe interessasse mais do que a política. Mas a ordem era passada por minha mãe. Uma mulher precisava educar bem os filhos. E educar era reprimir.

As festinhas. E então as bebidas, cuba-libre, gin fizz, hi fi. Bebidas de mulheres. As mulheres não gostavam muito de cerveja, embora tomassem. Há muitas coisas de que a mulheres não gostam mas acabam se rendendo pelo gosto do homem.

Não fui uma filha obediente. Fui mal comportada e criei, digamos, alguns problemas. Hoje chamaríamos de inadaptação. Mas eu tinha que mentir, mãe. Lá fora estava tudo acontecendo. Não dava pra ficar em casa, né mãe? Então eu mentia, e quanto! Mas só quando cansei de ficar sempre em casa, enquanto todo o mundo saía, nem que fosse para excursão de colégio. Eu não, eu nunca. E chorava em cima da cama.

Foi por causa disso, mãe. Tu não foste moça na época em que eu estava sendo. Daí a incompatibilidade. Mas eu sei que não eras tu. Eras apenas a esposa do pai. Quem tu eras mesmo estava nos pratos, nos doces, nos pudins, naquele famoso, de chocolate, em camadas, com creme de baunilha, merengue batido à mão, e no cume, maravilhando, o morango, mãe, o morango de Pelotas.

Espero que estejas aí, com o pai, sei que amor havia; que ambos estejam mais relaxados, sem ter que educar ninguém. E olhem por mim, que não tenho pai nem mãe, sou avó e filha de mim mesma e nem sei fazer pudim. Por Gabriel e Gisa, os filhos de hoje, também pais. E por Corinha , que um dia já fomos e um dia nos será.


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13 de maio de 2010

13 DE MAIO - POESIA E LIBERDADE

Vieira da Silva (1908-1992)

O dia de hoje não é pouca coisa para nós, brasileiros. Além da abolição da escravatura, que resultou em tanta esperança e até hoje não foi assimilada nem por brancos nem por negros, 13 de maio marca a data de nascimento de Raimundo Correia (1859), Lima Barreto (1881) e Murilo Mendes (1991).
É provável que nenhum deles mereça destaque dos suplementos culturais, que hoje sofrem de artificialismo agudo, mas sempre há quem lembre, orgulhe-se e, mais importante, vá, como se rezasse, aos livros dos escritores mais amados.
Quem sabe, sabe. Quem não sabe... ao Google e descubra que essas três importantes estrelas brilham ainda no tal céu do Brasil, que felizmente é pródigo em artistas, para equilibrar com os outros, os que mandam contra.
De Raimundo Correia vai um dos seus mais conhecidos poemas, que povoou o Tesouro da Juventude e as seletas. E como é atual!

Mal secreto



Se a cólera que espuma, a dor que mora
N’alma, e destrói cada ilusão que nasce,
Tudo o que punge, tudo o que devora
O coração, no rosto se estampasse;

Se se pudesse o espírito que chora
Ver através da máscara da face,
Quanta gente, talvez, que inveja agora
Nos causa, então piedade nos causasse!

Quanta gente que ri, talvez, consigo
Guarda um atroz, recôndito inimigo,
Como invisível chaga cancerosa!

Quanta gente que ri, talvez existe,
Cuja a ventura única consiste
Em parecer aos outros venturosa!


De Murilo Mendes, do livro Poesia Liberdade, Os Pobres, que já foi capa do panorama, com ilustração de Maria Helena Vieira da Silva.

Os pobres

Chegam nus, chegam famintos,
À grade dos nossos olhos,
Expulsos da tempestade de fogo
Chegam de qualquer parte do mundo,
Ancoram na nossa inércia.

Precisam de olhos novos, de outras mãos.
Precisam de arados e sapatos,
De lanternas e bandas de música,
Da visão da licorne
E da comunidade com Jesus.

Os pobres nus e famintos
Nós os fizemos assim.


De Lima Barreto, que nasceu negro em 13 de maio, ofereço-lhes


Carta de um pai de família ao doutor Chefe de Polícia.


Senhor doutor chefe de Polícia. Permita vossa excelência que um velho chefe de família, pai de três filhas moças e dois rapazes, se dirija a vossa excelência, no intuito de esclarecer o espírito de vossa excelência que parece só ver as coisas por uma face só.

Moro, excelentíssimo doutor, há quase trinta anos na Rua Joaquim Silva, aí nas fraldas de Santa Teresa, rua plácida, sossegada, que vossa excelência talvez não conheça como bom chefe de polícia que é do Rio de Janeiro, mas natural da Bahia.

Não digo tal coisa para censurar vossa excelência, mas simplesmente para lembrar que os antigos chefes de polícia da minha leal e heróica cidade conheciam todos os seus meandros, becos, bibocas, etc. Os antecessores de vossa excelência, como o Vidigal, o dos granadeiros, e o Aragão, o do sino de recolher honestas, conheciam o Rio como qualquer malandro; mas, desde que inventaram a polícia científica, por sinal que fez aumentar os crimes misteriosos, desde en­tão, dizia eu, os chefes ficaram dispensados de conhecer o Rio de Janeiro, inclusive vossa excelência.

Moro, ia dizendo, na Rua Joaquim Silva há mais de vinte anos, com minha família, em casa própria, que foi a do pai de minha mulher e é agora nossa. Confesso a vossa excelência que me casei, contando (é preciso não esquecer a mulher) com a casa, pois naquele tempo era amanuense e sem a casa não poderia constituir família. De uma casa dessas, boa, sólida, ampla, arejada, cheia de recordações de família, a gente, há de concordar vossa excelência, não se muda assim. Ela faz parte da família, se não é a própria família. vossa excelência que é lido em direito, será certamente lido em sociólogos e sabe perfeitamente que quase todos cogitam na posse normal do domicílio familiar, coisa que consegui graças à minha prudência e às economias do madeireiro português, pai da minha mulher. Não posso, nem me devo mudar, isto diante de todas as leis que não são votadas pelo congresso.

Acontece excelência, que de uns dias a esta parte vie­ram para a minha vizinhança umas "moças"que não são bem parecidas com as minhas filhas nem com as primas delas. Eu conheço mal essas coisas da vida do Rio, e nem por isso quero ser chefe de polícia; e andei indagando de que pessoas se tratava e soube que eram "meninas", moradoras nas ruas novas, que a polícia estava tocando de lá, por causa das fa­mílias.

Mas, doutor, eu não tenho também família? Porque é que só as famílias daquelas ruas não podem ter semelhante vizinhança e eu posso?

"Doutor: eu não tenho nenhuma ojeriza a essas "senhoras", embora nunca me tivesse metido nessas coisas. Casei-me cedo e tenho sempre labutado para a família, desde amanuense até agora que sou chefe de seção; mas não compreendo que a polícia e a justiça persigam certos entes por crime que não está em lei. De resto, se há crime, há pena e a pena não pode ser essa de domicílio coacto ou de interdição de residência que não estão no Código.

A polícia na lei conhece ladrão, gatuno, cáften, assas­sino, mas não conhece semelhantes senhoras.

Não quero discutir com vossa excelência tais coisas. Sei que vossa excelência é o doctor angelicus das escolas da Bahia; mas falo sempre como Sancho Pança e julgo como ele na ilha da Baratária.

Se as famílias da Rua Mem de Sá, não podem ter por vizinhas tais "meninas", muito menos as da Rua Joaquim Silva.

Demais, quando se fez a referida avenida, elas logo tomaram lugar. Há a favor delas o tal uti possidetis, o que não acontece com a minha triste rua. Vossa excelência deve meditar bem sobre o assunto, para não classificar as famílias da Rua Joaquim Silva abaixo das de Mem de Sá. Não há hierarquia familiar na nossa sociedade. Não é doutor? De vossa excelência etc. Augusto Soromenho Albernaz, chefe de seção da Secretaria do Fomento.

"P. S. - Quando acabava de escrever esta a vossa excelência vieram oferecer-me 500$000 de aluguel pela minha casa. Está aí em que deu o ato de vossa excelência: valo­rizou as casas da Rua Joaquim Silva e naturalmente desva­lorizou as da Avenida Mem de Sá. Não aceitei e espero que os tribunais superiores dêem a todos o direito de morar onde bem lhes parecer conveniente. O mesmo".

Conforme o original.

Careta, Rio, 24-4-1915


Viram só? 1945. Estamos em 2010 e poderíamos mandar a carta para o prefeito Eduardo Paes.

Ele entenderia? Não sabemos. Fiquemos com outro poema de Murilo Mendes porque eu, como todo o mundo, sou parcial e tenho minhas preferências.


O sono


Dorme.

Dorme o tempo em que não podias dormir.

Dorme não só tu,

Prepara-te para dormir teu corpo e teu amor contigo.

Dorme o que não foste e o que não serás.

Dorme o incêndio dos atos esquecidos,

A qualidade, a distância e o rumo do pensamento.


O pássaro volta-se,

As árvores trocam os braços,

Os castelos param de andar.


Dorme.

Que pena não poder me ver - puro - dormindo !


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11 de maio de 2010

DE MASSAS E MISSES

Desculpem se insisto. Há tanta coisa sobre as quais escrever. Os lançamentos dos livros de meus amigos Augusto Sérgio Bastos e Lina Tâmega Peixoto, a poesia mesma, o cotidiano, as relações humanas, mas eis que algumas coisas mostram que cada geração precisa descobrir a roda. E que os jornais não aproveitam em nada o potencial educativo que têm.
É que O Globo publicou no domingo, na Revista (a mesma que apresentou matéria sobre o cultivo caseiro de maconha), duas páginas sobre a realização do concurso Miss Marijuana promovida pelo site Hempadão.
Ora, o site, que é engraçado, bem feito e informativo, tem muitas coisas interessantes, mas vai que o Globo se interessa exatamente pelo que tem de mais atrasado, machista e conservador, que é justamente o velho e batido concurso de miss. Trata-se de um tema sobre o qual já escrevi, que é a posição secundária das mulheres na luta pela legalização. Elas só aparecem para dar uma conotação sexual e subserviente à questão, ou seja, concurso de miss.
Entende-se que a moçada, em dia com os hormônios, se dedique ao evento, mas que o Globo, o jornal, dê visibilidade a isso, é desgastante.
Na mesma edição, página 38, caderno de ciência e saúde, publica matéria sob o título BRASIL PODE GANHAR AGÊNCIA SOBRE USO MÉDICO DA MACONHA.
Ai a matéria é séria. O tema será discutido num simpósio internacional sobre Drogas Psicotrópicas nos dias 17 e 18 de maio em São Paulo, certamente por homens.
Eis aí uma duplicidade de tratamento: onde estão as mulheres, concurso de miss, gracinhas, desvalorização intelectual da mulher, que é o que esse tipo de concurso sempre foi; do outro, a cannabis como remédio, cientificamente estudado - por homens.

De relevante, apenas a declaração de Robert Malcher-Lopes, professor do Departamento de Fisiologia da Universidade de Brasília: "As barreiras para o uso médico da maconha não encontram respaldo no conhecimento científico. Mesmo considerando contra-indicações e efeitos colaterais."
O que posso concluir? Que a legalização pode ser útil (para o Globo) nos dois sentidos: ajudar no tratamento de doenças (rsrsrs) e levar um pouco de "entretenimento aos leitores" (+ assinantes + publicidade + dinheiro), via concurso de miss. Afinal, é preciso mostrar o que as mulheres têm de melhor, não é mesmo?
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8 de maio de 2010

A PROCURADORA DA LITERATURA


De repente, faz-se a polêmica. E o texto abaixo, de autoria de Astrid Cabral, vem a propósito de outro, de autoria de Flora Sussekind, no qual ela lamenta que o crítico Wilson Martins tenha vivido. O texto, publicado n´O Globo (23.04.2010), foi contestado por Afonso Romano de Sant´Anna em seu blog e despertou muitas manifestações de apoio. http://www.affonsoromano.com.br/blog/

Publico aqui a opinião de Astrid sobre o assunto, primeiro porque concordo com ela, depois porque a Srta. Flora Sussekind nunca teve a minha admiração, em virtude de seu texto sempre confuso e mal pontuado, a ponto de às vezes a gente não saber sobre o que ela está escrevendo. Enfim, aquelas leituras que você tem que engolir em nome de um "prestígio" que não se sabe de onde veio.

De qualquer forma, toda a vaidade exacerbada precisa de um freio, antes que se torne perigosa.


A PROCURADORA DA LITERATURA

Astrid Cabral

Sempre fui entusiasta de polêmicas porque elas promovem uma acalorada exposição de idéias e muita luz deriva do atrito das pedras. Mas para que isso aconteça é necessário equilíbrio e uma habilidade típica da esgrima.

Como no caso das guerras ou batalhas há que haver uma simetria de forças para que o embate não se transforme num massacre e adquira feição indiscutivelmente criminosa. Tripudiar com aqueles que não podem reagir ou responder é abominável covardia. A promotora que agride a criança indefesa, a crítica que se insurge contra o colega morto, são exemplos de equivalente pusilanimidade.

O respeitável crítico e professor Wilson Martins viveu nada mais nada menos que 90 anos. Houve, portanto, tempo de sobra para que a jovem crítica Flora Sussekind apresentasse a ele suas objeções e pontos de vista diametralmente opostos, fornecendo ao público um debate de idéias enriquecedor, propiciando inclusive um diálogo com a perspectiva de diferentes gerações.

No entanto, ela aguardou o momento infausto do necrológio dele para se insurgir contra as justas reverências que lhe foram prestadas..É como apunhalar o defunto. O que poderia explicar, não digo justificar, essa atitude de estranho desrespeito, senão uma descabida rivalidade com o merecido prestigio de Wilson Martins? Prestigio conquistado por uma vida inteira de admirável competência e dedicação, além da dignidade da franqueza, moeda rara no jogo das relações humanas e da eterna feira de vaidades.

Como já disse em versos Cecília Meireles, Quem pode ser verdadeiro/ sem que desagrade? Digamos que cada um deles defenda a sua particular e única verdade, desagradando o outro, digamos que haja atritos incontornáveis, mas que haja sempre respeito. É inadmissível que um intelectual no uso de sadias faculdades mentais se comporte como um bárbaro sem reconhecer o valor de seu oponente.

Por que o campo das letras há de ser um rinque de competições ou uma rinha de galos? Por que ceder ao sensacionalismo do espetáculo, dividindo as energias que devem ser somadas contra problemas de âmbito bem mais grave do que divergências de cunho pessoal?


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3 de maio de 2010

MAIS UM DOIS PARA AS IMAGENS












As fotos são de Anna Heller.
O povo e a esperança são do Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Bahia, Pernambuco, Santa Catarina, Ceará, Minas - o Brasil todo querendo: LEGALIZE!











UM DOIS - RUMO À LEGALIZAÇÃO



Passado o domingo, que é para o descanso, eis que a segunda se apresenta para os comentários.

Pra começar, a lua nova que apareceu na noite de sexta-feira já trazia bons prenúncios, apesar do dia, que foi feio.

No sábado, dia 1º de maio, o sol, grande parceiro, se apresenta soberano, dizendo o primeiro sim ao movimento da legalização. (A natureza está em harmonia em relação às causas conjuntas). E eis que a Marcha aconteceu.

A imprensa já mostrou as fotos e disse que havia cerca de 1.500 pessoas. Outros dizem que havia mais. Não importa. Podemos deduzir que se havia 1.500 na marcha, outras 15.000 estavam por perto sem se envolver muito. Alguns nem saem da areia, que eu sei. Alteram o nível de consciência só para um barato, mas não alcançaram um nível de consciência que as faça pensar nas implicações sociais da proibição das drogas.

Fiz uma planfetagem na areia, pela manhã, e pude constatar mais uma vez que a receptividade à legalização é muito maior do que a resistência ou a aversão à medida. Os contra não tem outros argumentos que não sejam a cara feia e os lugares comuns, de que uma droga leva a outra mais forte, e outras cositas afins. Lêem pouco, ao que tudo indica.

Umas pessoas perguntam, outras já começam dizendo que são a favor, e outras já estão até fumando um, como é do conhecimento de todos.

Há vários pontos de vista interessantes que mereceriam uma abordagem mais profunda e freqüente. Não se pode esperar que uma idéia se transforme fazendo uma manifestação por ano. É preciso que ela tenha desdobramentos a fim de que as pessoas resistentes, pouco a pouco, dissipem as suas dúvidas e percebam que a causa da legalização é uma causa pelas liberdades individuais; que a repressão é fonte de mortes, medo, corrupção e custos enormes para o Estado; que a educação e a conversa sincera entre pais e filhos é a melhor forma de fazer com que um jovem decida sobre o que quer ser, usar ou fazer.

As grande ausência, já esperada, foi a de Marcelo Anthony, que poderia contribuir bastante com a propagação da idéia à frente de outros atores, cineastas, escritores, jornalistas, empresários, profissionais liberais, mães e avós de família que conhecemos. Isso sem falar em Gabeira, que pendurou as chuteiras, Marcelo D2, que tem um contrato a cumprir como os demais artistas, ou FHC, que preferiu se calar agora que é tempo de eleições.

Carlos Minc esteve lá e disse o que já vem sendo dito há muito tempo: o modelo proibicionista é um fracasso. Mais do que falar, mostrou a cara, coisa que pouca gente tem coragem.
Já anoitecendo, os participantes se encaminharam para o Arpoador, onde foi feita uma vigília em memória dos que morreram na guerra às drogas.

Tudo correu bem, sem percalços. A polícia esteve presente mas não incomodou, e os adeptos puderam ao menos soltar a voz, já que a fumaça é proibida.
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