4 de maio de 2013

LA VIE EN ROSE


É possível que você tenha visto por dentro o azul do céu de ontem. Você acordou tarde e foi encontrar com seu velho, para almoçarem juntos. Ele cozinhou e os dois se refestelaram, depois, com os pastéis de nata que você levou para a sobremesa. Descansaram um pouco, depois saíram para uma caminhada. O dia estava todo maio, e foi bom caminhar assim, os dois, pelas mesmas calçadas do passado, sob as mesmas árvores. Mais um pouco e estariam de mãos dadas. Mas não. Agora não cabe. Ambos estão velhos, embora lembre um pouco a sensação de antes, quando o velho passa a mão por cima do seu ombro, às vezes, para que se toquem, para que continuem se tocando pai e filho que são. Separam-se na praça. Cada um para sua casa. E então, o noticiário, que não deixa ninguém viver em paz.



LA VIE EN ROSE


Daniel  Santos



Tudo feliz no mundo das imagens que consagram a aparência. Tudo rosa – cor sem ofensas. Processos se adensam até a tensão, mas o risco de se alterar o tom, de carregar nas tintas, faz tudo refluir à harmonia imposta.

A lei manda ser feliz na época mais aflita, quando, por impossível seguir avante, os impulsos se concentram no espaço que deveria ser já passado. Vive, assim, a recorrência pífia de um gerúndio sem ereções.

Hoje, o presente é para sempre, e a fermentação intestina, a emissão de gases sem válvulas de escape, concentra o risco de uma explosão para dentro, de uma implosão que reduzirá a História a vácuo, menos que nada.

Agora, nem passado nem futuro, nem começo nem fim! O que há se ocupa da manutenção da permanência: renova procedimentos, altera o design, mas não sai de si, que só de si sabe falar. Sozinha, resmunga.

No mais, é essa felicidade à força, velhice proibida, morte adiada! E morrer seria uma saída, um novo curso ao tempo que empacou gago. Por ora, é isso: tudo rosa, muito, muito aquém do revolucionário vermelho.


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