4 de agosto de 2010

MACONHA, PORTA DE ENTRADA?

Desculpem se insisto, mas quero compartilhar com meus persistentes leitores esse texto primoroso que por acaso se refere à maconha.
Marcos Rolim é advogado e político gaúcho. Lembro dele, dos meus tempos de Assembléia Legislativa no Rio Grande do Sul como um quadro novo do PT que se dedicou, no primeiro mandato, à questão (ou ao imbroglio) da segurança pública. Lembro das discussões que conduzia, dos interrogatórios...e dos resultados. Achava-o um pouco autoritário, mas muito inteligente e muito rápido no raciocínio. Bom orador.
Pois o tempo passou, e eis que aquele valente militante, depois representante do PT está agora às voltas com o assunto que é mais grave que o caos da segurança pública e o tráfico de traficantes. Trata-se do crack - a peste.
Não posso convencê-los? Fiquem com Marcos Rolim. Garoto inteligente. E como escreve bem!
E ó, não é propaganda não. Nem sei se ele é candidato. Nem mesmo se ainda é deputado. Me interessam as idéias.

MACONHA PORTA DE SAÍDA?
por Marcos Rolim*


A epidemia de crack é um dos fenômenos mais sérios na interface entre saúde pública e segurança. O que a faz particularmente grave é a reconhecida dificuldade de superar a dependência química. Pois bem, a Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) realizou pesquisa com 50 dependentes químicos de crack que foram submetidos a um tratamento experimental de redução de danos. Sob a coordenação do psiquiatra Dartiu Xavier, o grupo foi tratado com maconha. Daquele total, 68% trocou o crack pela maconha. Ao final de três anos, todos os que fizeram a troca não usavam mais qualquer droga (nem o crack, nem a maconha). Anotem aí: todos.
Imaginei que, com a divulgação destes resultados por Gilberto Dimenstein, na Folha de S. Paulo em 24 de maio, haveria grande interesse sobre o estudo. Nada. A resposta ao mais impressionante resultado de superação da dependência de crack no Brasil foi o silêncio. O uso medicinal da maconha tem sido admitido em dezenas de países, inclusive nos EUA. Por aqui, o tema segue interditado pela irracionalidade. É evidente que o consumo de maconha pode produzir efeitos danosos. Sabe-se que o abuso pode conduzir o usuário a problemas de concentração e memória e que em determinadas pessoas o uso está correlacionado à precipitação de surtos esquizofrênicos. Daí a criminalizar seu consumo e impedir experiências destinadas ao uso medicinal vai uma distância que tende a ser percorrida pela intolerância e pelo obscurantismo.
O psicofarmacologista Eduardo Carlini sustenta que o princípio ativo da maconha pode ser útil no combate à depressão e ao estresse. O mesmo tem sido dito por cientistas quanto ao tratamento do glaucoma, da rigidez muscular causado pela esclerose múltipla, ou como apoio aos pacientes com Aids, aos que sofrem do mal de Parkinson e aos que se submetem à quimioterapia em casos de câncer. Estudo da USP com pacientes que ingeriram cápsulas de canabidiol, um dos compostos encontrados na erva, demonstrou resultados positivos no tratamento da fobia social e na redução da ansiedade.
As oportunidades abertas por estudos do tipo, entretanto, assim como a necessária pesquisa, estão impugnadas no Brasil por um discurso preconceituoso e por uma legislação ineficiente e estúpida. Seguimos repetindo que a maconha é “a porta de entrada” para o consumo de drogas mais pesadas, o que pode traduzir tão-somente uma “falácia ecológica” (quando se deduz erroneamente a partir de características agregadas de um grupo), vez que o universo de consumidores de maconha é muitas vezes superior ao grupo dos dependentes de drogas pesadas que se iniciaram pela cannabis. Em outras palavras: é possível que a maconha seja mais amplamente uma opção alternativa às drogas pesadas e não uma droga de passagem. Independentemente disto, é possível que a maconha seja uma porta de saída para a dependência química por drogas pesadas. O que, se confirmado, será uma ótima notícia.

marcos@rolim.com.br

*Jornalista

Texto publicano no Jornal Zero Hora de Porto Alegre, RS
Para acessar o artigo em sua página original clique aqui.

3 comentários:

  1. Obrigado Helena, pelo post. Aquele menino que conheceste tem agora 50 anos (no próximo dia 16). Dou aulas na universidade e coordeno a comunicação social do TCE. Atuo também como consultor em segurança pública e estou terminando meu doutorado em sociologia na UFRGS. Estou longe da política partidária desde 2003 quando terminou meu mandato como Deputado Federal (e quero ficar assim). Mas sigo lutando pelos direitos humanos, porque é preciso.
    Um abração

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  2. Caros, Rolim e Helena
    Como eu digo: quando temos vergonha na cara e honestidade no lombo tudo é debatido abertamente e para que possam ser registradas as verdades e assim o povo fazer suas escolhas. Abraços continuem assim, parabéns!
    Tenho uma dúvida e gostaria de esclarecimento: tenho acompanhado atualmente grande apreenção de maconha no Brasil, porque não ocorre o mesmo com realação as dogras mais pesadas?
    Abraços Rejane

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