Foi o poeta Alcides Buss quem me informou sobre a morte da poeta polonesa Wislawa Szymborska, no dia 1º de fevereiro. E eu só conhecia os poemas selecionados por Carlos Machado, no poesia.net Mas eis que morre, pouco depois de traduzida e publicada pela Companhia das Letras.
Assim é com os poetas. Morrem, e então vamos ler o que escreveram. Quem foi? Alguns têm uma segunda chance, outros se vão de fato para sempre. Daqui a 40 anos um deles será descoberto pelo pesquisador e terá sua obra reavaliada e divulgada. De que vale, pensam os autores, ansiosos por reconhecimento?
Vale muito, porque o que importa é a poesia, e é ela que ressurge, já que o autor não pode mais ressurgir.
Foi-se a poeta, aos 88 anos. Fumou o quanto quis. Se não fumasse talvez chegasse aos 90? E em que isso mudaria a sua vida? divertiu-se, ao menos. E morreu tranqüila, em casa, conforme dizem os jornais.
São dela os dois poemas que seguem, e com isso faço a minha homenagem. Logo eu, que gosto de homenagear os vivos. Mas é também como uma reverência, um abraço que seja, a todos aqueles que se sentem poetas, não sabem por que são e não viveriam se não fossem. Aqueles, os diferentes, que trazem uma faixa invisível e inútil de que são, nem sabem ao certo o que seja - poetas.
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O TERRORISTA, ELE OBSERVA
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Wislawa Szymborska
(1923-2012)
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A bomba vai explodir no bar às treze e vinte.
Agora são só treze e dezesseis.
Alguns ainda terão tempo de entrar;
alguns de sair.
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O terrorista já passou para o outro lado da rua.
A distância o livra de todo mal
e a vista, bom, é como no cinema:
Uma mulher de jaqueta amarela, ela entra.
Um homem de óculos escuros, ele sai.
Uns jovens de jeans, eles conversam
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Treze e dezessete e quatro segundos.
Aquele mais baixo tem sorte, sai de lambreta,
e aquele mais alto entra.
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Treze e dezessete e quarenta segundos.
Uma moça, ela passa de fita verde no cabelo.
Só que aquele ônibus a encobre de repente.
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Treze e dezoito.
A moça sumiu.
Se foi tola de entrar ou não
vai se saber quando os carregarem pra fora.
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Treze e dezenove.
Parece que ninguém mais entra.
Aliás, um gordo careca sai.
Mas remexe os bolsos como se procurasse algo
e às treze e vinte menos dez segundos
ele volta para buscar a droga das luvas.
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São treze e vinte.
O tempo, como ele se arrasta.
Deve ser agora.
Ainda não.
É agora.
A bomba, ela explode.
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RECITAL DA AUTORA
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Musa, não ser um boxeador é literalmente não existir.
Nos recusaste a multidão ululante.
Uma dúzia de pessoas na sala,
já é hora de começar a fala.
Metade veio porque está chovendo.
o resto é parente. Ó Musa.
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As mulheres adorariam desmaiar nesta noite outonal,
e vão, mas só ao assistir a uma luta colossal
Só lá as cenas dantescas.
E o ascenso aos céus. Ó Musa.
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Não ser boxeador, ser poeta
estar condenado a duras florbelas,
por falta de musculatura mostrar ao mundo
a futuro leitura escolar - na melhor das hipóteses -
Ó Musa. Ó Pégaso,
anjo eqüestre.
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Na primeira fila um velhinho sonha docemente
que a finada esposa ressuscitou e
assa para ele um bolo com passas.
Com fogo, mas não alto, para o bolo não queimar,
começamos a leitura. Ó Musa.
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"O terrorista" parece um roteiro de cinema, uma beleza ler, entre a flecha do cupido e a bomba (na poesia) prefiro a explosão.
ResponderExcluirbeijo
Bela poesia, belo texto, bela homenagem.
ResponderExcluirBeijo, Gui
Helena, uma bela escolha.
ResponderExcluirGosto muito dela.