Ariano Suassuna não existe mais no mundo dos vivos. Há de criar outros mundos, onde estiver, ou outros movimentos, que sua vitalidade ainda era para muito. A sua morte, e as outras que vieram depois ainda tentam se encaixar na realidade quando Eduardo Campos explode no rol das improbabilidades, atropelando todas as outras que se ofereciam a ela: a dos agonizantes, dos suicidas, dos desnutridos. A morte, no entanto, não dá a mínima para probabilidades. Ao contrário, prefere surpreender. Dessa vez concretizou-se numa explosão que impactou o Brasil, trouxe a trágedia para a realidade da família de cada vítima e mexeu profundamente com o processo eleitoral. Não nos queixávamos da apatia? Pois aí está o fato que nos faz cair sentados, sem entender nada, ou pelo menos sem entender por muito tempo, até que chegam as notícias, os analistas, a nossa própria elaboração do que aconteceu.
Nada muda. Nesse momento há novos filhos sem pai, conhecendo a morte irreparável, trazendo-lhes uma sombra que pesa para quem tinha a certeza de um futuro promissor. Depois do enterro, a pergunta: e agora, o que vai ser de mim? O tempo, dirão uns, o tempo tudo aplaca. às vezes até cura.
Passado isso, preparo-me para a morte de amanhã e me pergunto: o que ficou? O presidente do partido e Marina fizeram um pacto de não falar em sucessão antes do enterro, Entretanto anteontem mesmo os jornais já levantavam a possibilidade da viúva de Eduardo Campos ser vice de Marina. Ora, isso quer dizer que a viúva deve ter sido consultada e que portanto não houve pacto nenhum. O pacto era só para figuração, sentimentalismo. E com essa mentira iniciam uma campanha, uma nova campanha.
Ah espécie humana, tão especial. Chora, ri, sofre e tortura. Uns são políticos, outros são poetas. Uns riem sempre. Outros têm um cantar estranho.
LÁPIDE
Ariano Suassuna
Quando eu morrer, não soltem meu Cavalo
nas pedras do meu Pasto incendiado:
fustiguem-lhe seu Dorso alardeado,
com a Espora de ouro, até matá-lo.
Um dos meus filhos deve cavalgá-lo
numa Sela de couro esverdeado,
que arraste pelo Chão pedroso e pardo
chapas de Cobre, sinos e badalos.
Assim, com o Raio e o cobre percutido,
tropel de cascos, sangue do Castanho,
talvez se finja o som de Ouro fundido
que, em vão – Sangue insensato e vagabundo —
tentei forjar, no meu Cantar estranho,
à tez da minha Fera e ao Sol do Mundo!
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