7 de outubro de 2010

A POESIA É A ÚNICA SAÍDA PRO NADA

(Lou Viana)


Ontem vi um filme coreano chamado Poesia, apresentado no Festival. Foi o título que me atraiu, claro. Mal consigo assistir a um ou dois filmes do festival, todo o ano. Mas por esse eu fui. E esperei. Eu e uma multidão que aguardava em fila e grande animação. Fiquei pensando como, de repente, um público tão diverso pode ter se interessado por poesia. Bons ventos.
No filme a personagem é uma senhora aposentada que quer, em meio à sua tumultuada vida, escrever um poema. Um, que seja. Ela participa primeiro de aulas, depois de encontros com leitura de poesia no Centro Cultural da cidade. O filme é bonito e triste. As leituras são boas e divertidas.
Não vou contar o filme. Mas poucas vezes tive oportunidade de ver no cinema a poesia pontificando. Fiquei feliz, claro, que alguém tenha pensado nisso e feito um belo trabalho.

Não bastasse, hoje recebo a chamada para a entrevista feita por Selmo Vasconcellos, no blog http://antologiamomentoliterocultural.blogspot.com/2010/10/lou-viana-entrevista-n-266.html,
que publico abaixo na certeza de que vão gostar de conhecer a grande figura que é Lou Viana e sua poesia essencial, engraçada, desafiadora.


LOU VIANA




PEQUENA BIOGRAFIA

LOU VIANA é graduada em Letras e Psicologia. Tem especialização em Literatura Brasileira e em Literaturas Africanas e Mestrado em Teoria Literária, título da dissertação: "O saber do humor". De 1999 a 2007, participou da comissão editorial do Jornal Panorama e do Poesia Viva (jornais de poesia da cidade do Rio de Janeiro). Publicou: "O céu do lençol" pela Sette Letras em 1996 (nome de autora: Luiza Viana") e "Fina ficção" em 2010 pela Editora da Palavra (nome de autora: Lou Viana). Tem poemas citados no livro de Jomard Muniz de Britto "Atentados Poéticos", Editora Bagaço, Recife, e no artigo de Gustavo Bernardo "O Nominalismo Medieval na Base da Fenomenologia Moderna", do Seminário do Instituto de Letras da Universidade do Estado do Rio de Janeiro em 2000.

COMENTÁRIOS SOBRE "O CÉU DO LENÇOL" :

ANTONIO CARLOS SECCHIN: "Luiza Viana retoma com felicidade o veio da escrita epigramática: ' Poesia é a única saída pro nada': humor ferino, amor felino ('nessa carícia de veludo'), em alta voltagem poética.”

MANOEL DE BARROS: “Sua poesia é puro afago para a inteligência e a sensibilidade. Poemas substantivos, sem sestros, enxutos. Sem truques. A pura essência do ser”.

COMENTÁRIOS SOBRE "FINA FICÇÃO":

JOMARD MUNIZ DE BRITTO: "Você não faz nem pretende fazer hai-kais, poema segundo, amor-humor, rumor-urbano porque denega toda a retórica pós-moderna e iluminações da mais finita eternidade".

RITA MOUTINHO: “Gostei muito de seu "Fina ficção" em que mostra muita coerência com toda sua poesia anterior, uma personalidade poética bem definida. Você nos transmite uma enormidade de sentimentos com um mínimo de signos expressivos.Interessante sublinhar como você titula bem, estando os títulos indissoluvelmente ligados com o texto do poema.”

ENTREVISTA

SELMO VASCONCELLOS -Quais as suas outras atividades além de escrever?

LOU VIANA - Tenho grande interesse pela educação de crianças e adolescentes. Realizo oficinas literárias utilizando exercícios teatrais e a leitura de contos ou poemas que levam o sujeito a refletir e a se expressar. Os exercícios teatrais facilitam o surgimento da espontaneidade e da integração entre os membros do grupo.
A essência da proposta é a ênfase no pensar: pensar sobre si, as relações com o outro, com a vida, com o mundo concreto. Busca-se o desenvolvimento da pessoa e a reflexão sobre sua ação no mundo. A leitura do texto literário em grupo, e a conseqüente troca de idéias e respeito à opinião do outro, abre o campo de percepção do sujeito e amplia sua visão de mundo.


SELMO VASCONCELLOS - Como surgiu seu interesse literário?

LOU VIANA - Sempre li muito, desde criança. Nessa época, adorava poemas que continham um certo humor, ou muito dramáticos. Era muito sensível ao ritmo dos textos, rimas incomuns e à musicalidade das palavras. O interesse na literatura sempre foi básico em minha vida. Fiz Curso de Letras e dei aulas de Português, sempre buscando despertar o aluno para o texto literário.
Quanto à minha escrita própria, ela surgiu a partir da necessidade de escrever para me compreender, uma espécie de desabafo. Com o passar do tempo ela foi adquirindo concretamente um desenho de poesia, adquirindo um ritmo poético. Foi se condensando: de uma forma dramática povoada de explicações para algo mais sucinto, mais enigmático.

SELMO VASCONCELLOS - Quantos e quais são seus livros publicados dentro e fora do Brasil?

LOU VIANA - Publiquei "O céu do lençol" (poesia) pela Sette Letras em 1996 e agora, em 2010, "Fina ficção" (também poesia), pela Editora da Palavra - ambas as editoras são do Rio de Janeiro. Pretendo proximamente reeditar "O céu do lençol" e publicar minha dissertação de Mestrado: " Ítalo Calvino e o saber do humor ".

SELMO VASCONCELLOS - Quais os impactos que propiciam atmosferas capazes de produzir poesia?

LOU VIANA - O que posso dizer a partir de minha experiência é que a poesia surge geralmente a partir de um forte apelo emotivo. Porém mesmo quando a poesia se origina mais da determinação da vontade, tem de haver total entrega à escrita - vencer a angústia ao papel em branco - para a produção do poema. Existe também a necessidade de se estar totalmente "distraída", alienada da compulsão repetitiva do cotidiano. Outra coisa importantíssima, que induz à escrita e a seu aprimoramento, é a leitura de bons autores, aqueles com quem a gente se identifica.

SELMO VASCONCELLOS - Quais os escritores que admira?

LOU VIANA - Sempre li e reli a poesia de Fernando Pessoa. O conceito de beleza, para mim, se expressa plenamente na forma poética de João Cabral de Melo Neto. Meus ficcionistas preferidos são Gabriel García Márquez (com o romance "Cem anos de solidão" e seus contos maravilhosos), Machado de Assis e sua ironia reveladora e Dostoiévsky que descortina, de forma dramática, os lados mais sombrios da alma humana. Não posso também deixar de destacar Ítalo Calvino e seu romance "Palomar", que impulsionou minha dissertação de Mestrado sobre o saber do humor.

POEMAS

Todo ser carrega em si
a maldição e a bênção
de existir


Metamorfose

A Clarice Lispector

Me sonhei com asas
acordei bicho rasteiro


Deusmônio

Você é um monstro com asas
Eu, um anjo com garras


Doce trama

A João Cabral

Quero partilhar com alguém
minha vida, labor,
suor e lágrimas

Com o tesão que fervilha
em praça de touros de Espanha

e nas minhas entranhas


Poeta

A vida me
escreve
nas entrelinhas


Auto-retrato

Pernas grossas e varizes
nariz tolo
torto pensamento
algumas próteses

Não sou a maior das maravilhas
nem a pior das hipóteses


Ano 2020

Mais uma mulher
que cede à tentação
de posar vestida


Vôo das letras

A Machado de Assis,
in memoriam

Intelectual tupiniquim
toda a pompa e circunstância

Porque ninguém é de ferro

In: Fina Ficção, Ed.da Palavra, Rio de Janeiro, 2010.

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2 comentários:

  1. Un abrazo grande desde Santiago de Chile, mis felicitaciones por esta labor de divulgación de la poesía y su gracia,

    Leo Lobos

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  2. SAUDAÇÕES À GRANDE LOU VIANA - GRANDE AMIGA GRANDE POETA -

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